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Aderivaldo Ramos de Santana
(Doutorando em História Contemporânea pela Universidade Paris IV –
Sorbone, onde prepara a tese intitulada “Osifekunde escravo no Brasil e
homem livre na França 1820-1841. Leitura atualizada de Notice sur le
pays et le peuple des Yèbous en Afrique de Marie-Armand d’Avezac,
publicado em 1845”)
A aventura de um homem que foi nobre na África, escravo no Brasil e informante na Europa
Todo ser humano é um espelho de sua época, mas algumas trajetórias
parecem ter sido talhadas para servir de síntese de importantes aspectos
da história coletiva. Assim foi a vida de Osifekunde.
Nascido em 1793 na cidade de Makum, do reino Ijebu, no sul da atual
Nigéria, Osifekunde era descendente de uma família aristocrática. Seu
avô, Ochi-Wo, foi cunhado e superintendente de finanças do rei
Ochi-Gade. Seu pai, Ade-Sounlu, foi um importante comerciante, profissão
que transmitiu aos filhos em inúmeras viagens mercantes em território
ioruba. A mãe, Egght Adê, primeira das sete esposas de Ade-Sounlu, era
também uma aparentada do rei.
No final do século XVIII, os guerreiros ijebus resistiram ao domínio do poderoso Império Oió, que se expandia para o sul após reduzir a vassalos a maioria dos seus vizinhos, inclusive os daomeanos. Com o declínio desse império, na primeira metade do século XIX, o território iorubano atravessou um período de guerras e constantes transformações políticas. O reino Ijebu, no entanto, manteve-se inabalado: entre 1820 e 1825 aliou-se a alguns refugiados de Oió, anteriormente seus inimigos, e com os guerreiros da cidade de Ifé para conquistar o controle de um importante centro comercial, o mercado de Apomu, ponto de encontro de mercadejantes de várias regiões. Também obtiveram o domínio das rotas e das atividades comerciais que ligavam o interior do continente africano com o litoral, particularmente com a cidade de Lagos. Os ijebus comercializavam diretamente com os europeus, para quem vendiam escravos e tecidos, os chamados panos da costa.